Enquanto a Câmara Municipal aprovava os generosos reajustes salariais para o prefeito, vereadores e secretários, a gestão de Wellington Maciel anunciava, quase simultaneamente, um conjunto de demissões em massa. Essas demissões, realizadas no último dia 11 de dezembro de 2024, afetaram centenas de trabalhadores contratados e comissionados, muitos deles atuantes em setores essenciais como saúde, educação e assistência social.
O Argumento Oficial
A justificativa dada pela gestão para as demissões foi a necessidade de "adequar as contas públicas" e deixar o município em condições financeiras "mais equilibradas" para a nova administração. Em comunicado à imprensa, a prefeitura afirmou que as medidas eram "amargas, porém necessárias", destacando o objetivo de ajustar as despesas ao limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
"Precisamos cortar na carne para que o município tenha condições de iniciar o ano de 2025 com capacidade financeira para atender às demandas da população e cumprir os compromissos com fornecedores e folha de pagamento", dizia a nota oficial divulgada pelo gabinete do prefeito.
Contudo, a narrativa de austeridade foi rapidamente confrontada por especialistas e pela população, que enxergaram na decisão um exemplo clássico de "austeridade seletiva", onde os cortes recaem sobre os trabalhadores mais vulneráveis, enquanto os benefícios da elite política permanecem intocados — e, no caso de Arcoverde, aumentados.
Quem foram os atingidos?
Os cortes atingiram principalmente servidores contratados e comissionados, muitos dos quais desempenhavam funções estratégicas no funcionamento de serviços essenciais. Entre as áreas mais impactadas estavam:
Saúde: Técnicos de enfermagem, auxiliares administrativos, agentes comunitários de saúde e até médicos foram dispensados. Algumas unidades básicas de saúde (UBSs) relataram interrupções nos atendimentos devido à falta de pessoal.
Educação: Auxiliares de sala e profissionais de apoio em escolas municipais também foram desligados, comprometendo o suporte às crianças e às equipes pedagógicas.
Assistência Social: Programas voltados para populações em situação de vulnerabilidade, como o Bolsa Família e o CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), perderam funcionários responsáveis pelo atendimento direto às famílias.
Um agente de saúde dispensado relatou ao Portal do Sertão: "Trabalhamos o ano todo enfrentando as dificuldades do sistema público e, agora, somos descartados sem aviso prévio. É revoltante ver que, enquanto nós somos cortados, eles aumentam os próprios salários."
Contradições entre o discurso e a prática
O timing das demissões, ocorrido apenas uma semana após a aprovação do aumento salarial para os agentes políticos, gerou revolta e descrença entre a população. A contradição entre a justificativa de "falta de recursos" e a disposição para conceder reajustes substanciais colocou em xeque a seriedade do discurso de austeridade da administração Wellington Maciel.
Especialistas em finanças públicas questionaram o real impacto das demissões no equilíbrio fiscal do município.
Segundo a economista Ana Clara Batista, consultada pelo jornal Folha de Pernambuco, "os cargos cortados representam despesas importantes, mas não significativas ao ponto de justificar o argumento de salvar as finanças públicas. É uma medida paliativa que atinge os mais vulneráveis e não enfrenta as verdadeiras fontes de ineficiência na administração pública."
A reação da população
A repercussão das demissões foi imediata e explosiva. Nas redes sociais, moradores de Arcoverde expressaram indignação com a disparidade de tratamento entre os trabalhadores contratados e os políticos. Comentários como "Eles tiram o emprego de quem realmente trabalha para dar aumento a quem já ganha muito" e "Vergonha nacional em Arcoverde" inundaram as publicações relacionadas ao tema.
Entidades sindicais e movimentos sociais locais também se posicionaram contra a decisão. O Sindicato dos Servidores Municipais de Arcoverde (SISMARC) classificou as demissões como "injustificáveis e desumanas". Em nota, o sindicato afirmou:
"É inadmissível que o município alegue falta de dinheiro para manter médicos e professores, mas encontre recursos para aumentar os salários da elite política. Isso demonstra a prioridade da gestão: beneficiar os que estão no poder e penalizar os que mais precisam."
Impactos no funcionamento dos Serviços Públicos
As consequências das demissões começaram a ser sentidas quase que imediatamente. UBSs ficaram sobrecarregadas devido à redução no número de profissionais de saúde, escolas municipais enfrentaram dificuldades para atender à demanda de alunos sem os auxiliares de sala, e programas sociais foram paralisados em algumas regiões.
"Fui ao posto de saúde na segunda-feira e não tinha ninguém para atender. Mandaram voltar outro dia porque o médico foi demitido. Isso é um absurdo!", relatou uma moradora do bairro São Cristóvão ao portal Arcoverde Notícias.
Esse cenário gera um alerta para a nova administração, que encontrará um sistema público debilitado e terá de recontratar ou reorganizar rapidamente os serviços para evitar um colapso total.
A nova gestão e o desafio da coerência
Com a transição de governo, Zeca Cavalcanti, eleito para um terceiro mandato, herda um município sob pressão popular e com desafios significativos na gestão de pessoal. A equipe de transição terá que lidar com as consequências das demissões em massa, equilibrando o orçamento enquanto repara os danos causados pela saída abrupta de trabalhadores essenciais.
A expectativa da população é que Zeca rompa com as práticas da gestão anterior e adote uma abordagem mais responsável e transparente. Contudo, os reajustes salariais aprovados pela Câmara levantam dúvidas sobre o real compromisso da nova administração em evitar privilégios e priorizar as demandas populares.
O que fica para a população?
Para os cidadãos de Arcoverde, as demissões em massa e os aumentos salariais revelam um padrão de governança que prioriza interesses políticos em detrimento do bem-estar coletivo. Este é um momento crucial para que a população permaneça vigilante, cobrando ações efetivas da nova administração e exigindo que o discurso de renovação se traduza em práticas concretas.
A cidade não pode mais arcar com gestões que penalizam os trabalhadores para manter privilégios. A responsabilidade de mudar essa dinâmica não está apenas nas mãos dos governantes, mas também nas de cada cidadão que deve exercer sua cidadania ativa, questionando, fiscalizando e exigindo responsabilidade fiscal e social.
Arcoverde precisa avançar, mas isso só será possível se o interesse público for colocado acima dos interesses individuais da classe política.
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